Paulo Nascentes[i]
A
mente que se abre a uma nova ideia jamais volta ao seu tamanho original.
(Albert Einstein)
Pode uma educação transnacional nos levar ao
reencontro com o Ser essencial que somos – e do qual nos temos afastado? A emancipação
humana exige um instrumento de comunicação transcultural como garantia de
condições iguais no diálogo. Todos os dias, em mais de 120 países nos cinco
continentes, ocorrem encontros internacionais sem a necessidade dos
dispendiosos serviços de tradução. Neles, em vez da língua nacional de alguns
poucos, a conversa vem na língua internacional neutra Esperanto. Esse encontro
entre iguais lembra um simbólico aperto de mão linguístico entre irmãos.
Prevalece o que em nós é essência, e não circunstâncias como etnia, língua ou nacionalidade.
Queremos ser emancipados e livres entre cidadãos igualmente livres e
emancipados? Nesse caso, a educação deve preservar as diversas culturas, mesmo
as tribais e minoritárias, o que significa promover, para cada pessoa, o uso da
sua língua étnica e o letramento na língua nacional e em uma língua
internacional comum.
Sete são os princípios para uma intercompreensão
eficaz que nos permita vencer os desafios propostos pela crise atual. Nem a
globalização desta ou daquela língua nacional, nem as novas tecnologias de
comunicação, nem a adoção de novos métodos de ensino de línguas vão garantir esses
princípíos essenciais para a manutenção de uma ordem linguística justa e
eficaz.
1. Democracia
Um sistema de comunicação que privilegia algumas
pessoas, mas exige das demais enorme esforço, anos a fio, para alcançarem uma
capacidade de comunicação inferior à dos falantes nativos é, na essência,
antidemocrático. A desigualdade linguística acarreta desigualdades de
comunicação em todos os níveis, inclusive no nível internacional. Já aconteceu
com você se sentir sem escolha ao negociar em que língua falar com um oriental,
por exemplo, e ver que o idioma dito internacional imposto a vocês trouxe enormes
dificuldades e complicações na pronúncia, na falta de vocabulário ou no uso de
expressões idiomáticas e que a tentativa de comunicação deixou muito a desejar?
No máximo, as compras. Jamais uma conversa plena...
2. Educação
transnacional
Como chave para a solução da barreira das
línguas, esse o ponto a enfatizar. Toda língua étnica está ligada a determinada
cultura e a determinada nação ou conjunto de nações. Por exemplo, quem estuda
inglês faz contato com a cultura, a geografia e a política dos países
anglófonos, principalmente Estados Unidos e Grã-Bretanha. A educação
transmitida por meio de uma língua étnica está necessariamente ligada a
determinada perspectiva sobre o mundo. Uma educação transnacional, ao
contrário, nos põe em contato com o colorido variado das mais diferentes
culturas. Além de ampliar nossa receptividade ao diferente, com a valorização
da riqueza das culturas tribais, com seus saberes tradicionais e úteis, ela nos
dá meios e modos de enfim nos tornarmos de fato cidadãos planetários. Partilhar
uma língua neutra com os que a usam traz a vantagem da participação plena nas
ações de organismos do terceiro setor, ongs
e entidades que promovem a cultura de paz e a proteção ambiental. Como
convidados e mesmo hóspedes dos moradores locais, jamais seremos apenas
turistas levados só a lugares sugeridos por agentes de viagem, vendo paisagens
pela janela de vãs e ônibus. Ao contrário, ter amigas e amigos prontos a nos
mostrar seu dia-a-dia, como se faz na cultura esperantista, em todo o mundo, é
muito mais divertido. Posso garantir!
Embora em Educação o alcance de certas medidas
só possa ser avaliado após algumas décadas, do ponto de vista individual as
vantagens são imediatas, tão logo se possa comunicar em Esperanto. Por se tratar
de uma língua mais fácil de aprender do que a maioria das línguas nacionais, a
distância entre o aprendizado e o uso fica bem menor. Lógica, simplicidade
fonética e gramatical, ausência das temíveis exceções e o vocabulário
internacional – que se multiplica com novas palavras formadas com o auxílio de
cerca de 30 prefixos e sufixos – isto acelera a aquisição da língua. Em
Esperanto você amplia seu vocabulário de forma rápida e divertida. É como combinar
blocos coloridos no uso do conhecido brinquedo Lego.
3. Eficácia
pedagógica
Pesquisa recente mostra que só uma pequena
percentagem dos que estudam uma língua estrangeira são capazes de dominá-la. As
dificuldades das línguas étnicas constituem um obstáculo permanente para muitos
estudantes. Mas, usufruir do conhecimento de uma segunda língua é fundamental
hoje mais do que nunca. Como sair do impasse?
4. Multilinguismo
A educação escolar deveria proporcionar a cada
pessoa, independentemente da importância da sua língua materna, uma
oportunidade real para dominar uma segunda língua, de forma a conseguir
comunicar-se no mais alto nível presencialmente ou pela Internet.
5. Direitos linguísticos
Entre as várias línguas verificam-se
desigualdades de poderes, fonte de constante insegurança linguística, ou mesmo
opressão linguística, para grande parte da população mundial. Nos anúncios de
emprego, é comum a absurda reserva de vagas para falantes nativos de países
desenvolvidos. Essas desigualdades destroem as garantias, exaradas em tantos
documentos internacionais, de igualdade de oportunidades para todos,
independentemente das respectivas línguas maternas.
6. Diversidade linguística
De modo geral, os governos consideram que a
diversidade linguística constitui um obstáculo à comunicação e ao
desenvolvimento. Ao contrário, essa diversidade é uma fonte de riqueza
constante e inesgotável. Por isso, qualquer língua, tal como qualquer espécie
de ser vivo, dado o seu valor intrínseco, deve ser protegida e apoiada. Assim,
a política de comunicação e desenvolvimento, se não estiver alicerçada no
respeito e no apoio a todas as línguas, constitui uma sentença de morte para a
maior parte das línguas do planeta.
7. Emancipação do ser
humano
Qualquer língua, na medida em que dá aos seus
falantes a possibilidade de comunicarem entre si, impede-os de se comunicarem
com os outros: é simultaneamente uma libertação e uma prisão. No entanto, existe
uma comunidade internacional que vive esses princípios hoje. E, portanto, já dispõe
de instrumento linguístico adequado para o exercício da cidadania mundial em
bases igualitárias. Os sete princípios aqui apresentados podem ser lidos em sua
versão completa em http://pt.wikipedia.org/wiki/Manifesto_de_Praga
Concluindo
O mundo está de olho no Brasil. A grande mídia ignora importantes avanços. Por exemplo, tramita na Câmara, já
aprovado no Senado, projeto de lei que propõe o ensino não obrigatório de Esperanto
no nível médio. Você sabia? Na justificativa, o professor Cristovam Buarque
defende a cultura de paz associada à Língua Internacional desde sua criação, há
125 anos, pelo então jovem humanista Lázaro Ludovico Zamenhof. Afinal, a emancipação
humana é direito nosso. Imperialismo cultural e linguístico pertence
aos estertores da velha ordem.
Serviço
Esperanto é uma das 14 línguas ensinadas no UnB
Idiomas. Mais informações no portal
[i]
Professor de Português, Literatura e Esperanto. Aposentado do Instituto de Letras
da UnB e examinador de Esperanto credenciado pelo ITK, Universidade de
Budapeste.